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domingo, 26 de setembro de 2021

MYRIAM FRAGA


Semeadura



O limite da luz
é o espaço do salto.

É a casa do sonho,
o caminho de volta,
extravio ou derrota.

O pássaro é este silêncio
cortando como faca.

É a bicada no ventre:
semeadura de mel
nos meus campos molhados.

Oh! eterno seja o passo
minha pele no teu aço,
ó pássaro, pássaro.

Senhor do sol me arrebata,
ó pássaro,
tuas garras como arado
revolvendo meus pedaços.

Meu corpo de sementeira
na raiz do teu abraço.

Um arco-íris de espigas
no meu seio, meu regaço
como um odre

na esperança de teu vinho,
meu canto no teu cansaço
ó pássaro, pássaro.




- Myriam Fraga, em "A lenda do pássaro que roubou o fogo". Salvador: Editora Macunaíma, 1983


Biografia AQUI

domingo, 19 de setembro de 2021

CLAUDIA MEYER


 A solidão se respira à beira do vazio,

o abandono floresce à margem da trilha clandestina.
Sem paz, gozo, sossego ou sonho vão,
mas sim o frio que brota na clave de sol em meu universo,
o frio que agride esse corte da cabeça aos pés.

A vida desliza em minha caverna de incertezas.
A respiração anseia por noites neófitas e por voltar a sonhar.
A margem não percebe quando a dor é uma órbita.
Não importa a queda quando o fundo é ficção,
quando em desgosto se encontra todo o prazenteiro abismo.


Biografia AQUI

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

AMÉLIA VEIGA

 

África breve
                                                                      a Alice

África breve,
Quebrar de onda,
Sussurro de vento,
Estrela cadente,
Roçar de asa,
Mágico momento
Na eternidade do meu tempo,
Chão e casa ...
Leite e mel,
A terra prometida,
Espaço doce-amargo
No universo vazio
Da minha vida...

Apodreceram as sementes
Do amor que plantei
Na raiva lavrada do teu ventre...
Não era o lugar e nem a estação
Para a colheita apetecida ...
Era o trágico momento
Da sangrenta vitória
Do ódio sobre a vida,
Da dramática contradição
De ser e não ser da tua gente
E da renúncia assumida
Nas marés da História...

África breve,
Redimida,
Transcendida
Nas lágrimas da memória...

 


biografia AQUI 

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

VIVIANE MOSÉ


Toda palavra 


Procuro uma palavra que me salve
Pode ser uma palavra verbo
Uma palavra vespa, uma palavra casta.
Pode ser uma palavra dura. Sem carinho.
Ou palavra muda,
molhada de suor no esforço da terra não lavrada.
Não ligo se ela vem suja, mal lavada.
Procuro uma coisa qualquer que saia soada do nada.
Eu imploro pelos verbos que tanto humilhei
e reconsidero minha posição em relação aos adjetivos.
Penso em quanta fadiga me dava
o excesso de frases desalinhadas em meu ouvido.
Hoje imploro uma fala escrita,
não pode ser cantada.
Preciso de uma palavra letra
grifada grafia no papel.
Uma palavra como um porto
um mar um prado
um campo minado um contorno
carrossel cavalo pente quebrado véu
 mariscos muralhas manivelas navalhas.
Eu preciso do escarcéu soletrado
Preciso daquilo que havia negado
E mesmo tendo medo de algumas palavras
preciso da palavra medo como preciso da palavra morte
que é uma palavra triste.
Toda palavra deve ser anunciada e ouvida.  
Nunca mais o desprezo por coisas mal ditas.
Toda palavra é bem dita e bem vinda.



- Viviane Mosé, em "Toda palavra".  Rio de Janeiro RJ: Editora Record, 2008.


Biografia AQUI

domingo, 5 de setembro de 2021

NADIA ANJUMAN

 

HISTÓRIAS TRÁGICAS

Oh histórias trágicas
Encontraram uma morada em nossos corações.
Esses olhos tristes, essas bochechas fundas e amarelas
São as marcas sombrias de tua presença
Oh galhos da dor
Cem primaveras e outonos indo e vindo
Brotos murchos com corações dilacerados
Cem bloqueios e cem caravanas passam
O Faraó morre e a história de Nimrod termina
Ainda que estejas jovem e fresco
Recém saído do útero do jardim

Oh miséria ardente
Deixe a expansão de nossos corações
Não são as únicas coisas pelas quais vale a pena queimar
Por uma única vez, passe na casa de outro

Oh histórias trágicas
Sua companhia nos oprime
Se não buscam uma nova casa, devem ter cuidado
Amanhã vamos deixar as tristes ruínas da vida
E vocês ficarão miseráveis e descobertas
No limbo do tempo
Sem qualquer morada


Nádia Anjuman uma promissora poeta afegã, foi assassinada pelo seu marido aos 25 anos de idade, apenas por querer ir visitar a irmã, contra a vontade dele.

Biografia AQUI