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domingo, 21 de agosto de 2022

ROSALIA DE CASTRO

 







SOMBRA  NEGRA

Quando penso que você está fugindo,
sombra negra que me espanta,
ao pé da minha cabeça, você
volta zombando de mim.


Se eu imagino que você se foi,
no mesmo sol você olha,
e você é a estrela que brilha,
e você é o vento que sopra.

Se eles cantam, você é quem canta,
se eles choram, você é quem chora,
e você é o murmúrio do rio                                                                                         e você é a noite e a aurora.


Em tudo você é e você é tudo,
para mim em mim você mora,
você nunca me abandonará,
sombra que sempre me surpreende.

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

LICÍNIA QUITÉRIO


                                         

foto de Licínia Quitério




Poema 


Há homens que atravessam a rua
sem olhar
Levam nos ombros pedaços da noite
e não há cor que os vista
São homens cinzentos 
indiferentes ao sol ou à borrasca
Quem os vê diz
ali vão os homens tristes
mas nem eles sabem o tamanho
da tristeza ou da improvável alegria
O chão da rua conhece
a cadência incerta
a leveza ausente
dos passos destes homens
Há quem lhes chame homens de bruma
porque vagos são
os seus contornos
Virá uma manhã sem homens tristes
Ninguém perguntará
para onde foram
Alguém escreverá a sua história
no livro branco
do esquecimento
A rua permanece

Licínia Quitério


Biografia

Licínia Correia Batista Quitério, nasceu em Mafra, em 30 de janeiro de 1940. Foi professora, tradutora, correspondente comercial.

Tem editadas as obras de poesia Da Memória dos Sentidos (2005); com prefácio de José Fanha, De Pé sobre o Silêncio (2008), com prefácio de Hélia Correia; Poemas do Tempo Breve (2011), com prefácios de Joaquim Pessoa e Cristina Carvalho; Os Sítios, 2012; O Livro dos Cansaços (2015). Em prosa publicou Disco Rígido (2013) Disco Rígido - volume II (2015).

Mantém dois blogues, desde 2006, O Sítio do Poema e Outros Sítios. Tem colaborado em jornais e revistas. Diz poesia e ensina a dizer. Organiza tertúlias com poetas convidados.

domingo, 7 de agosto de 2022

ANA LUÍSA AMARAL- TESTAMENTO

 



Testamento

Vou partir de avião
E o medo das alturas misturado comigo
Faz-me tomar calmantes
E ter sonhos confusos

Se eu morrer
Quero que a minha filha não se esqueça de mim
Que alguém lhe cante mesmo com voz desafinada
E que lhe ofereçam fantasia
Mais que um horário certo
Ou uma cama bem feita

Dêem-lhe amor e ver
Dentro das coisas
Sonhar com sóis azuis e céus brilhantes
Em vez de lhe ensinarem contas de somar
E a descascar batatas

Preparem minha filha para a vida
Se eu morrer de avião
E ficar despegada do meu corpo
E for átomo livre lá no céu

Que se lembre de mim
A minha filha
E mais tarde que diga à sua filha
Que eu voei lá no céu
E fui contentamento deslumbrado
Ao ver na sua casa as contas de somar erradas
E as batatas no saco esquecidas
E íntegras.


Ana Luísa Amaral

Ana Luísa Amaral partiu a 5/08/2022. Foi das primeiras poetas a habitar este espaço com o poema "Um céu e nada mais" em 2008. Isso diz bem de quanto gosto da sua poesia. 

LUZ E PAZ para o seu espírito  

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

VERA DUARTE

 


DESEJOS




Queria ser um poema lindo
cheirando a terra
com sabor a cana

Queria ver morrer assassinado
um tempo de luto
de homens indignos

Queria desabrochar
— flor rubra —
do chão fecundado da terra
ver raiar a aurora transparente
ser r´beira d´julion
em tempo de são João
nos anos de fartura d´espiga d´midje

E ser
riso
flor
fragrante
em cânticos na manhã renovada


VERA DUARTE 

Biografia AQUI